quarta-feira, 27 de julho de 2016

fiscalização da limpeza de graffiti


Autarcas criticam entrega da fiscalização da limpeza de graffiti a um privado

https://www.publico.pt/local/noticia/autarcas-criticam-entrega-a-um-privado-da-fiscalizacao-da-limpeza-de-graffiti-1730907?page=-1



A decisão da Câmara de Lisboa gerou criticas na Assembleia Municipal. Está em causa um valor de 719 mil euros, a somar aos 4,2 milhões de euros que deverão ser pagos pela remoção dos graffiti.

A Câmara de Lisboa prevê gastar 4,2 milhões de euros na contratação de “serviços de remoção de graffiti e cartazes”, por um período de três anos, e outros 719 mil euros na aquisição de “serviços de fiscalização aos serviços prestados pelas empresas contratadas para a remoção”. Na Assembleia Municipal de Lisboa foram várias as vozes contra estas contratações. 
“Quer-nos parecer que a câmara se terá esquecido de preparar uma outra proposta para contratar uma terceira empresa que fiscalize a inspecção da segunda empresa sobre a primeira empresa”, afirmou, com humor, o deputado Sobreda Antunes. “Ou talvez tal não venha a ser necessário caso a segunda empresa seja uma subsidiária da primeira, assobie para o lado e em vez de fiscalizar se limite a fazer figura de corpo presente”, acrescentou o eleito d’ Os Verdes, na reunião da assembleia municipal desta terça-feira.
Sobreda Antunes manifestou ainda a sua preocupação com o facto de as propostas não incluirem “exemplos fotográficos” ou “definições” dos “graffiti e cartazes” que a autarquia pretende que sejam removidos, não havendo uma explicitação do “que pode” e do que “não deve” sê-lo.
“Quem nos garante que um trabalho de Vhils ou de Bordalo II não será, até por engano, apagado da história dos murais da capital?”, perguntou, questionando se o objectivo do município não seria “a pura e simples remoção de cartazes políticos”. O deputado do PEV considerou ainda “exorbitante” o valor de 4,2 milhões de euros, defendendo que há na cidade “outras obras mais urgentes e inadiáveis” por fazer.
Já Cristina Andrade, do Bloco de Esquerda, considerou “perigoso” entregar-se estas actividades a terceiros, manifestando o receio de que quem vier a ser contratado não saiba distinguir “intervenção política” de “lixo que deve ser apagado”.
Pelo PSD, Luís Newton mostrou-se também contra as propostas camarárias mas por razões distintas: o autarca, que é presidente da Junta de Freguesia da Estrela, entende que “haveria ganhos inequívocos”, “do ponto de vista financeiro e operacional”, se a competência de remoção de graffiti na cidade fosse confiada às juntas de freguesia. 
A defesa da posição da câmara coube ao vereador Duarte Cordeiro, que acusou a oposição de “demagogia”. “Somos uma cidade amiga da arte urbana”, frisou o autarca com os pelouros das Estruturas de Proximidade e da Higiene Urbana, acrescentando que “não há ano em que se aumente o número de espaços para a exposição de arte urbana na cidade”.
Quanto aos 4,2 milhões de euros, Duarte Cordeiro notou que está em causa um período de três anos, o que em seu entender permitirá “dar estabilidade ao trabalho” de remoção de graffiti. Hoje em dia, já existem contratos com terceiros para esse efeito mas são anuais. O autarca disse ainda que “há espaço para a complementaridade”, que é como quem diz para a actuação em paralelo das juntas de freguesia nesta matéria.
Apesar de a discussão ter ido mais longe, aquilo que competia à Assembleia Municipal de Lisboa votar era a possibilidade de os encargos relativos às duas propostas serem repartidos por vários anos. PSD, PCP, PEV e BE votaram contra em ambos os casos, enquanto que o CDS e o MPT se opuseram apenas à repartição referente aos serviços de fiscalização. 
Quando a proposta foi discutida em reunião camarária, em meados de Abril, o vereador centrista considerou o valor de 719 mil euros para esse efeito “verdadeiramente excessivo”. João Gonçalves Pereira defendeu que a fiscalização poderia ser feita de “outras formas”, nomeadamente com recurso a uma aplicação tecnológica através da qual os munícipes pudessem denunciar situações a carecer de intervenção.
Já Carlos Moura, do PCP, defendeu na ocasião que estão em causa “incumbências” da câmara que, especialmente no que diz respeito à fiscalização, não deveriam ser atribuidas a outros.

---


sexta-feira, 22 de julho de 2016

Mural de Nuno Saraiva vandalizado na Mouraria



A infeliz acção de colocar tags sobre a pintura mural de Nuno Saraiva, e sobretudo os comentários e diálogos posteriores quase exclusivamente orientados na direcção da sua reprovação, levam-me à escrita impulsiva, não académica, sobretudo para arrumar as minhas ideias (talvez de forma partilhada). E desengane-se o leitor pois eu não tenho gosto nem talento para a escrita, a minha forma de expressão “natural” é o desenho, infelizmente já tão pouco posto em prática (outro tópico ainda mais profundo).

Sei que a maior parte das pessoas desconhece as origens e motivações do que tem vindo a cobrir inúmeras paredes com murais da designada Arte Urbana. É normal, não é claro e tornou-se cada vez menos claro com o passar do tempo, pois foram-se acumulando valores inesperados e de maior relevo inerentes aos trabalhos de grande qualidade que foram aparecendo.

A relação da Galeria de Arte Urbana com os tags, que estão no âmago do graffiti, é direta, especificamente e originalmente com os tags do Bairro Alto, porem não está resolvida.

Ou seja, o tag que é a forma de graffiti que mais prevalece nas nossas cidades, competindo com muitas outras formas de comunicação, motivou o aparecimento do projeto do Município de Lisboa na perspectiva do dialogo com os seus executantes, é claro dialogando com aqueles que estiveram e estão disponíveis para esse dialogo em determinados momentos, em prol de determinadas acções.
Outras acções especificamente como os tags criminalizam-se, e são alvo de investimentos milionários para a sua remoção e manutenção dos mesmos for a das ruas da cidade, diga-se de passagem com resultados discutíveis.

Certo é que se criaram condições (e bem) para a proliferação da existência de murais de muitas autorias que em nada se relacionam com o propósito inicial de relacionamento com a tensão gerada pelo tag nas ruas de Lisboa. O problema surge quando estes murais são (mal) interpretados como parte do problema e não possível solução e caminho para o autor do respetivo tag.

Muitas vezes os caminhos estão vedados pela (crescente) institucionalização do fenómeno de pintura mural, gerando discursos ambivalentes de sucesso dos que no passado fizeram tags e que hoje são reconhecidos. É evidente que cada caso é um caso, cada autor é diferente e em constante mutação conforme o estado de espírito, as generalizações são portanto arriscadas, e caiem no âmbito das ciências sociais. Do ponto de vista plástico o tag em abstracto é fruto de profundos debates e considerações quer pelo design ou pela arte como áreas profissionais de actividade. Estou convicto (e em investigação própria averiguo) que estamos perante práticas que ecoam fundo na relação do Homem com o território.

Este caso concreto vem relembrar a complexidade de tudo isto, a meu ver enfatizada pelo facto de Nuno Saraiva ter sido o autor, entre muitas outras coisas, da capa do mítico álbum dos Mata Ratos, representativa de uma atitude profundamente punk e contra-sistema, infelizmente não reconhecida pelos autores dos tags. Por fim outra questão relevante parece-me ser a organização e o cuidado coletivo no sentido da preservação do trabalho, diria que mais elementos patrimoniais mereciam tal atenção, pois até porque, a bem ou a mal, tags existem muitos e por todo o lado.


ligações:
https://www.publico.pt/local/noticia/mural-de-nuno-saraiva-vandalizado-na-mouraria-1739047


no FB de Nuno:

21/07/16
Normalmente um artista não vandaliza o trabalho de outro artista. A não ser que seja um quadrúpede acéfalo filho de uma mula. Obrigadinho ao anormal.






21/07/16
Quero agradecer a todos os que aqui deixaram palavras solidárias, de revolta, algumas até demasiado chateadas. Obrigado. Li todos os comentários, um a um. Diz aqui o meu amigo André Ruivo que este género (street art) é efémero. Tem toda a razão e sempre achei que este dia iria chegar, era previsível, o lugar é pouco iluminado à noite, pouco habitado. Às catástrofes naturais que ameaçam um trabalho destes devemos sempre incluír o ataque de terceiros.
Alerta-me por outro canal de mensagem a Lara Luís: "- lei das ruas nuno". Tem também a sua razão, mas na minha percepção de "lei" considero isto um atentado, que é descaradamente reivindicado (assinado com as patas, como diria o Ramalho Ortigão), e que terá uma retaliação: vou pegar nas tintas e restaurar a ilustração.
Quando aceitei o convite da JFSMM não me limitei a desenhar, investi muito tempo em investigar uma ideia fixa: estava determinado em estudar a História dos cavaleiros da posta real do séc XIX que ali chegavam e dali partiam para distribuirem correspondencia pelo nosso país. Não posso por isso deixar isto assim, transporcado.
Aos teóricos que estudam o fenómeno TAGs: tenho cá para mim que os "Tagas", estas criaturas artilhadas de sprays da Montana e outras marcas menos baratas, seguem uma lógica territorial de guerrilha mas sem um contexto crítico ou social, em defesa de nenhum valor, a não ser em defesa de um narcisismo boçal que insistem de apelidar de acção anárquica - que nem é pouco nem mais ou menos anárquica. Anarquia (lá vem a História outra vez) nasce à volta de 1870 a partir de um grupo revolucionário radical da Associação Internacional dos Trabalhadores. Trabalhadores. Aposto a minha mão direita em como nunca existiu ou existirá no planeta um Trabalhador que faça TAGS. São todos uma cambada de betinhos que resolveram, de quando em vez, fugir de casa dos papás.
Por último queria explicar-vos porque chamei de "artista" esta criatura. Foi pura e simplesmente para a ofender. Para a fazer agoniar. Quem faz isto não quer ser artista.